Alfredo “Rabazolas”

O seu poiso é a Senhora da Ponte, sempre fiel a Barcelinhos, a terra onde nasceu e onde sempre viveu. O seu amparo são duas muletas com que se desloca nas suas deambulações diárias pela vizinhança. “Ai Alfredo, Alfredo, quem te viu e quem te vê!”, exclama entre o lamento e a piada.
Alfredo “Rabazolas”, 89 anos de idade, guarda-redes do Gil Vicente nas décadas de 50 e 60 do século anterior, para quem não o viu jogar, como eu, tem foros de lenda, de herói das balizas gilistas, de estrela principal de muitas histórias.
As memórias já as guarda só para si, que vão longe, muito longe… Ou reparte-as com quem calha, com a família, com os amigos.
Divaga sobre uma vida repartida pelo Gil Vicente, pelos Bombeiros de Barcelinhos, pelo grupo coral e orfeão, pelo rancho folclórico, que ajudou a criar, sem contar com a tropa na Calçada da Ajuda, em Lisboa. Não é fácil ligar o discurso que vai saltando de episódio em episódio: “Corri as 7 partidas do mundo”, diz.
Tem uma cara jovem e o mesmo provável sorriso maroto de toda a vida.
“Não era atrevido, nem mal-educado e todas gostavam de mim. Mas quem me oferecesse na cara tinha que mas dar senão levava.”
Nasceu no Largo da igreja, foi criado com a avó, nunca conheceu o pai. A avó foi quem o sustentou sem lhe faltar com nada mas não frequentou a escola, só aprendeu a ler e a escrever na tropa.
“Barcelinhos naquela época tinha muita mais vida do que agora. Tascos eram porta sim porta não. Havia o Daniel ferrador, uma carpintaria de fazer carroçarias para camiões e por aí fora… Agora não há nada! Desde que os Bombeiros saíram daqui, é uma miséria.”
Teve dez filhos, cinco rapazes e cinco raparigas. E uma mulher, Maria Teresa Correia Amaral, que era uma “santa: a santa Teresa de Barcelinhos”.
Começou a jogar no Atlético de Barcelinhos, uma equipa popular. No Gil só quando veio da tropa, no início dos anos 50. Chegou a jogar no campo do Operário e no do Andorinhas.
Andou no entra e sai durante dois anos, entre o Gil e o Braga. O comandante Quintas foi decisivo para a sua fixação no Gil Vicente, mas acabou por assinar contrato era presidente o médico Francisco Torres, que já o tinha ajudado antes, dando-lhe emprego na quinta que possuía e a quem solicitou ajuda quando se casou.
Conta que quando esteve na tropa, um capitão levou-o ao Sporting, três vezes: “desculpe-me meu capitão mas sou do Benfica (‘primeiro sou do Gil’, diz convicto). Depois levou-me ao Belenenses, a mesma coisa. Acabei a tropa e vim-me embora”.
“Quando fui para o Gil, o guarda-redes era o Augusto Camilo, que tinha vindo do Famalicão. Era um guarda-redes de categoria, o Benfica queria-o, jogou na seleção”, diz.
Começou a ganhar um ordenado de 300$00 (1,5 €). O que o safava eram os prémios: uma vitória fora, 100$00, um empate 50$00. Em casa, uma vitória 50$00 e o empate 25$00.
Jogou com o Emílio do Gás Cidla, seu conterrâneo de Barcelinhos. Pagavam-lhes com duas refeições por semana, no fim do treino, na Virinha do Carvalho, uma tasca ao pé do Senhor da Cruz. Mais tarde pediu à Direção do Gil Vicente para trocar uma das refeições por algum dinheiro de que precisava para a sua vida, isto depois de a avó ter ido para o asilo.
Foi contemporâneo da chegada dos célebres jogadores espanhóis ao Gil Vicente: Eduardo, Nolito e Gelucho.
Trabalhou na Moagem Vouga: “Saía da Vouga às três horas da tarde, às quartas e sextas-feiras, para ir treinar.
“Rabazolas” diz que jogou mais de 20 anos no Gil Vicente. Quem lhe sucedeu nas balizas do Gil Vicente, foi Silva, que inicialmente foi para o Gil como extremo direito. Mesquita era o terceiro guarda-redes.
Saiu do Gil já depois dos 40 e acabou a jogar nos “Galos”, clube popular de Barcelinhos e depois nos veteranos.
Não usava luvas, quando estava a chover ligava as mãos. Mais tarde, Fiúsa, pai do ex-presidente, arranjou-lhe umas luvas. A alcunha ‘Rabazolas’ ganhou-a devido às mãos grandes.
“Passei coisas boas, passei coisas amargas”. Nada que lhe tire o sorriso que lhe aclara a cara, tantos anos passados.

Comentários

  1. Uma importante figura barcelenses com quem convivi, de perto e sempre admirei.

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