Os Vieiras (Futebol Clube)

Os Vieiras são uma daquelas famílias tradicionais portuguesas: numerosa e absolutamente toda virada para o futebol. Um dos factos curiosos é que, embora conhecidos por Vieiras, o apelido da família é Pimenta. O nome Vieira herdaram-no do avô, sem ter ficado registado como apelido de família. 
Mário Vieira, conhecido jornalista e compositor do Barcelos Popular, conta que já vão na quarta geração de futebolistas: a primeira foi a do seu pai, Augusto, e tios: Armando, Domingos e Raúl. 
Ainda o Gil Vicente não existia e já Augusto e os irmãos davam os primeiros chutos e participavam na organização dos clubes que o antecederam como o Barcellos Sporting Club, a União Barcelense, o Triunfo Sport Clube e o Operário Futebol Clube. Tempos em que os jovens desportistas jogavam em cada semana por um clube diferente, ou em que as famílias eram responsáveis à vez pela lavagem dos equipamentos… 

 Augusto, nascido em 1914, era um ala esquerdo e foi capitão de equipa. Armando era um homem golo, um ponta de lança com méritos firmados na praça, que, de uma vez, ganhou dois jantares por ter apontado os dois golos da vitória sobre o vizinho e eterno rival, Famalicão. Mas foram os filhos e netos de Augusto quem mais relevo tiveram nas lides futebolísticas. 
Com 15 filhos, dos quais 9 rapazes, o patriarca desta família de futebolistas viu vários deles brilharem ao serviço do Gil Vicente mas também de outros clubes para onde acabaram por ir jogar. Nesses tempos, dificilmente se ganhava a vida a jogar futebol e, para prover ao sustento da enorme prole, Augusto desempenhava um ofício duro mas eloquente: era compositor tipográfico numa das mais icónicas empresas barcelenses, a Tipografia Editora do Minho. Com ele foram trabalhar para a Editora do Minho os seus filhos João, Adão, Mário, Joaquim e Manuel. 
Foram tantos os filhos e os netos que, para além das “peladinhas” que com certeza faziam nas reuniões familiares, acabaram por fazer uma das equipas mais competitivas de futebol de salão com que disputavam os torneios das redondezas. 
Dois dos mais velhos, João e Adão, já falecidos, foram pilares do Gil Vicente na década de sessenta. Segundo Mário, acabaram por sair no ano de 1969, numa “purga” que os levou para o Trofense. Adão ainda regressou ao Gil, enquanto João e Mário acabaram no Forjães como jogadores, embora João se tornasse também treinador da equipa. 

Colegas de outras velhas glórias do Gil como Canário, Serôdio, Eduardo “espanhol”, Mesquita, Manelzinho brasileiro, Ferreira e Ferraz, todos já com muitos anos do clube, acabaram por ter que abandonar o Gil, onde já tinham demasiado poder… Na altura da sua saída, João e Adão renderam ao clube que representaram, mais do que uma década, verbas significativas. 
Mário fala com alguma amargura desses tempos. “Só o ‘Firinho’, ferrenho adepto gilista, e a claque ‘Família Gilista’ lhes prestaram uma homenagem simbólica, no intervalo de um jogo do Trofense em Vila Nova de Gaia”. 

 Depois de João e Adão, Lino Vieira, um irmão mais novo, foi um talentoso jogador do Gil, passando depois por clubes como Vianense, Desportivo das Aves, Famalicão e Feirense, terminando a sua carreira no Santa Maria. 
Lino começou a jogar nos “Galos”, de Barcelinhos, com 18 anos, já como sénior, junto com os irmãos, Adão, que era também treinador, Mário, Nel e Zé. Não jogou na formação de nenhuma equipa. Jogou até aos 30 anos como profissional e prolongou a carreira até aos 38, em equipas amadoras. Foi também treinador de vários clubes do concelho e fora dele. 
Jogador tecnicista, que colocava muito bem as bolas à distância e de bom drible, Lino marcou muitos golos. Foi o melhor marcador do Feirense, com 18 golos. As melhores recordações que guarda são das boas épocas que fez na Vila da Feira e na Vila das Aves, que culminaram com duas subidas de divisão. No Gil, fez 5 épocas, as três primeiras em 1975/76, 76/77 e 77/78, saiu e regressou novamente para fazer ainda mais duas. 
Os restantes irmãos Vieiras: Rogério, Quim, Manel e Zé, passaram também pelo Gil Vicente como jogadores e por várias outras equipas do concelho ou fora dele. Só Augusto, um dos nove rapazes, não jogou futebol, enveredando pelo halterofilismo. 
Na terceira geração, Rogério, filho de Rogério e neto de Augusto, foi um exímio defesa esquerdo do Gil Vicente, que alinhou ainda em equipas como o Braga e o Desportivo de Chaves, da primeira divisão portuguesa. 
Começou a jogar com 14 anos nas camadas jovens do Gil e júnior do Braga, mas foi no Forjães, da Associação de Futebol de Viana, já como sénior, que deu nas vistas, tendo sido o melhor marcador. Armindo João, então treinador do Gil Vicente, e ambos barcelenses, foi-o buscar. 
Rogério tornou-se defesa esquerdo, defendendo as cores gilistas durante 4 épocas, entre os 19 e os 23 anos. Do Gil rumou ao Desportivo de Chaves da primeira divisão nacional e daí voltou ao Braga. Quando tinha 30 anos e com várias propostas financeiramente muito boas, viu o Braga negar-lhe a carta de desvinculação e o contrato da sua vida futebolística. 
Acabou por ter de treinar sozinho durante um ano para manter a forma física e, no ano seguinte, foi jogar para o Esposende onde ficou 7 anos. Depois disso, ainda jogou no Fão, com 40 anos, clube onde tinha contrato como treinador. 
Augusto, seu irmão, foi também um talento que passou pelo Gil Vicente e o Felgueiras, treinado por Jorge Jesus. 
Vários primos de Rogério e Augusto também jogaram futebol em equipas amadoras. 
Na geração mais jovem, que milita ainda nas camadas jovens do Gil, Diogo Cerqueira, iniciado, e Zé Mário, juvenil, jogam desde meninos, perseguindo o sonho de uma família inteira. 

Mário, o nosso interlocutor, lembra histórias saborosas que misturam futebol e raparigas. Conquistas dentro e fora do campo, sempre com o mesmo pundonor, o mesmo garbo, o mesmo orgulho. 
A história dos Vieiras confunde-se com a do clube da terra que os viu nascer.


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