Barcelos, nos finais dos anos 30 do século XX, pela lente de Nicolás Muller
Éramos assim nesses tempos difíceis, de má memória: com estas roupas, descalços, de faces duras e desencantadas de trabalhadores pobres, onde se viam risos fugazes, pelos lugares que nos são familiares.
O Campo da feira, a Fonte de Baixo, as ruas que ainda hoje
conhecemos, os edifícios que reconhecemos. Os bois, os carros de bois, e os
porcos que se tangiam com uma varinha até à feira com um cordel atado a uma das
pernas traseiras.
Nicolás Muller, o fotógrafo húngaro que nos retratou, esteve
cá em Portugal, e em Barcelos, em 1939, ao serviço da France Magazine, e
retratou-nos desta forma crua e autêntica. Isso valeu-lhe a perseguição de
Salazar, que ordenou a sua prisão e de que só escapou devido às diligências do
pai, maçon e membro do Rotary Club.
O olhar comprometido tinha-o já feito abandonar o seu país
natal e viajar para França, onde conheceu Cartier-Bresson, Robert Capa, Brassaï,
fotógrafos com quem se identificava. Picasso quis comprar algumas das suas
fotografias.
Hitler inflava os seus discursos e Nicolás Muller via o ódio
aos judeus crescer, sentindo-se ameaçado.
Percorreu nessa altura, Itália, França, Espanha, Portugal e
Marrocos, sempre a fotografar, terminando por se fixar primeiro em Marrocos e,
depois, até ao fim dos seus dias, nas Astúrias, em Espanha.
Em Madrid, teve um bem sucedido estúdio. Morreu em 2000.
Quando fechou o estúdio, em 2015, a sua filha Ana Muller,
também fotógrafa, descobriu os cerca de 3000 negativos das fotografias feitas
nessa época, que incluem as fotografias feitas em Portugal e na nossa cidade.
Desde aí, já se fizeram mostras deste trabalho, em Madrid, em
Lisboa, em 2015, e no Porto, no Centro Português de Fotografia, de outubro de
2021 a fevereiro de 2022.
Para quando em Barcelos?
Nicolás Muller |
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